Casas do PRR em risco? “É exatamente isso que estamos a tentar evitar”

13-11-2024

Em entrevista ao idealista/news, o novo presidente do IHRU diz que a construção das 26 mil casas do PRR é "prioridade máxima".

O tempo começa a esgotar-se. Faltam menos de dois anos para Portugal concluir a construção das 26 mil casas financiadas pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). E se o país falhar este prazo, corre o risco de ter de devolver as verbas europeias. A pressão em cumprir estes objetivos é muita, sobretudo, no Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), que se depara com a falta de recursos humanos e de tecnologia. "Estamos hoje a lidar com estas políticas de habitação, com a pressão enorme do PRR, que temos de dar resposta", admite Benjamim Pereira, o novo presidente do IHRU, garantindo em entrevista ao idealista/news que está a "tentar evitar" que as dificuldades encontradas na instituição, tutelada pela Secretaria de Estado da Habitação, condicionem a execução do PRR.

Foi há cerca de dois meses que Benjamim Pereira assumiu a pasta de presidente do IHRU, tendo encontrado um organismo público em dificuldades. "O que encontrei foi claramente uma estrutura deficitária face aquilo que é a sua missão, que precisa de mais recursos humanos e precisa também de uma atualização tecnológica", começa por explicar o responsável na entrevista realizada à margem da XII Semana da Reabilitação Urbana do Porto, que decorreu em Vila Nova de Gaia na semana passada e contou com idealista como portal oficial.

Questionado se as dificuldades que encontrou no IHRU vão condicionar a execução do PRR e a meta de concluir a construção das 26 mil casas até 2026, Benjamim Pereira disse que "é exatamente isso que estamos a tentar evitar", mediante uma reestruturação interna do IHRU. "Estamos a fazer um diagnóstico por equipas profissionais, melhorar os processos e, no fundo, dar uma resposta para cumprir com aquilo que é a missão e os objetivos do IHRU, priorizando claramente o PRR, que é a nossa prioridade máxima neste momento", detalhou ainda o novo presidente do IHRU em entrevista ao idealista/news para ler em seguida, numa das suas primeiras intervenções públicas desde que assumiu o cargo, nomeado pelo Governo da AD. 

Que dificuldades é que encontrou quando chegou ao IHRU há cerca de dois meses? O que está a fazer para reestruturar a instituição?

Quando fui convidado para ser presidente do IHRU, o quadro que me foi apresentado era de dificuldades. Não foi surpresa nenhuma o que encontrei dentro do IHRU e que foi uma estrutura deficitária face aquilo que é a sua missão, que precisa claramente de mais recursos humanos e também de uma atualização tecnológica face às várias plataformas que existem, à gestão das bases de dados, ao reporte, etc. Há várias questões ligadas à gestão dos dados, que são críticas e que precisam muito de ser mudadas, além de instalações etc.

Do ponto de vista do trabalho, estamos hoje a lidar com estas políticas de habitação, com a pressão enorme do PRR, que temos de dar resposta. É uma urgência nacional dar resposta às necessidades de habitação e, portanto, coloca-se uma enorme pressão sobre os trabalhadores. E aquilo que estamos a fazer é um diagnóstico por equipas profissionais, melhorar os processos e, no fundo, dar uma resposta para cumprir com aquilo que é a missão e os objetivos do IHRU, dando preferência ao PRR, que é a nossa prioridade máxima neste momento.

"Queremos captar trabalhadores, essencialmente jovens, que têm a porta aberta neste momento para entrar no IHRU"

Perante a falta de recursos humanos, o IHRU pretende contratar mais trabalhadores para agilizar os processos?

O IHRU está permanentemente a contratar. Nós temos um sistema direcionado para aquilo que são os quadros da função pública do IHRU e também a contratação de trabalhadores especificamente para o PRR, porque foi através da estrutura de missão que foram disponibilizadas verbas, através da i01, neste sentido. E mesmo assim não conseguimos ter os quadros completos nem desse contingente, nem também daquilo que é o quadro do IHRU enquanto instituição. Isto é grave. O que acontece é que a pressão existente sobre o IHRU leva a que muitos trabalhadores acabem por querer sair e mudar-se para outras instituições, o que é perfeitamente legítimo.

Aquilo que pretendemos é demonstrar o contrário, a capacidade de resiliência desta instituição, a nobre missão que tem de abraçar. E, desta forma, queremos captar trabalhadores, essencialmente jovens, que têm a porta aberta neste momento para entrar no IHRU logo que queiram, seja a norte do país, seja a sul. É importante salientar que temos instalações também no Porto, pelo que os trabalhadores do Norte não têm de se deslocar para Lisboa e ficarem a conviver com o problema da habitação e vice-versa. Portanto, temos instalações nos dois locais que permitem acomodar novos trabalhadores.

Estas dificuldades que encontrou no IHRU vão de alguma forma condicionar a execução do PRR e a conclusão das 26 mil casas até 2026?

É exatamente isso que estamos a tentar evitar. Claro que seria muito melhor ter uma estrutura devidamente preparada, com o número de quadros necessários e com a estrutura tecnológica toda adequada também, e não estaríamos a passar por este sufoco. Portanto, claro que pode condicionar, mas também é verdade que estamos a fazer todo um esforço para que isso não resulte em prejuízo para o país, nem num atraso significativo na entrega das casas às pessoas. Os objetivos estão bem definidos, sabemos quais são as metas e os marcos que temos de cumprir até lá e estamos a fazer um esforço enorme para que isso seja uma realidade.

Como avalia o programa do Governo que quer construir quase 59 mil casas até 2030 no âmbito do 1º Direito? Esta medida causa ainda maior pressão ao IHRU apesar de complementar as 26 mil casas prevista pelo PRR?

Não diria que causa pressão, porque essa medida vem complementar aquilo que é a necessidade de cumprimento da meta de junho de 2026 para as 26.000 casas. É apenas para nos auxiliar nesse aspeto. Os 59 mil fogos, que incluem os 26 mil previstos no PRR, têm um prazo de execução até 2030, portanto a pressão não vem exatamente desses restantes, mas sim do cumprimento da meta mais próxima que é junho de 2026. Portanto, não há problema, podemos construir 70, 80 ou 90 mil casas, porque com tempo encontraremos os mecanismos para dar resposta mais imediata. E o próprio mercado – as empresas de construção – precisa de tempo para conseguir executar esses mesmos fogos.

Que estratégias se podem introduzir na construção de casas para dar uma resposta mais imediata? A construção industrializada é uma opção?

Sem dúvida, não há outra forma sem passar pela industrialização dos processos de construção. Da forma convencional, como se construía na década de 40/50, construir o número de fogos que é preciso construir em tão pouco tempo diria que é impossível. Portanto, é preciso mudar o paradigma. Não digo que as casas tenham de ser todas iguais, mas a forma de construir e as tecnologias que estão por trás da construção têm de ser otimizadas e feitas num ambiente industrial. Além disso, também temos um problema grave do ponto de vista da mão de obra. Não temos hoje em Portugal as pessoas necessárias e especializadas na construção. Por isso, é que a imigração é muito bem-vinda a Portugal, porque muitos imigrantes trazem esse 'know how' e essa disponibilidade de trabalho que a sociedade portuguesa já não está disponível para entregar.

O Orçamento de Estado para 2025 autoriza que o IHRU transfira património público para as autarquias de forma a criar mais oferta de casas acessíveis. Como avalia esta medida?

Essas dinâmicas são normais. O IHRU tem património próprio, como consta dos seus estatutos, e também recebe da Estamo património para habitação. Portanto, temos todo o gosto em fazer esse tipo de parcerias com os municípios e com outras entidades públicas, sendo muito bem-vindo. É muito bom que assim seja, porque permite agilizar ferramentas para dar cumprimento àquilo que importa, que é entregar as casas às pessoas.

A Estamo está a cadastrar os imóveis públicos que detém, estimando-se que sejam 60 mil. O IHRU está a receber imóveis da Estamo para transformar em habitação?

Sim, faz todo o sentido que assim seja. No fundo, a proveniência dos imóveis não me parece que seja um problema. O que é preciso é operacionalizar as relações, encontrar financiamento para essas operações e encontrar também o enquadramento do ponto de vista fiscal para facilitar e tornar viável o negócio. Também é preciso puxar o setor privado para construir connosco, porque não pode ser só o Estado a construir, através do IHRU e dos municípios. Este é claramente um esforço que tem de ser partilhado por todos, porque o número de casas que é necessário não é compaginável com aquilo que é a capacidade de resposta do IHRU. Portanto, isto é um esforço conjunto dos portugueses e não será por falta de terrenos e de edifícios existentes para reabilitar que não se cumprirá esse desidrato.

O que quer mudar no IHRU nos próximos tempos enquanto presidente? Como vê o IHRU do futuro?

Quero uma instituição forte, resiliente, capaz de ser exatamente aquilo para que foi concebida, cumprindo a missão de gerir o património que detém, de construir habitação, de promover parcerias, quer com o setor privado, quer com o setor público. Quero construir um espaço onde os trabalhadores sejam felizes, onde as pessoas consigam cumprir a sua missão e o seu trabalho com alegria, sabendo que estão, talvez, a desempenhar uma das missões mais importantes que existem em Portugal neste momento.

Porventura, a minha geração estará servida de habitação – embora não seja uma verdade absoluta. Mas para os jovens é muito importante essa perspetiva de ter acesso a uma habitação que consigam pagar com o seu salário. Não me preocupa tanto se é habitação própria ou se é arrendada. Mas sim que os jovens tenham um local onde possam construir um lar, uma família, e dar a este país a sua capacidade, o seu saber, a sua força de trabalho, os seus filhos, para serem felizes em Portugal. Esta é uma questão fundamental e a base logística para isso é a habitação.

Fonte: Idealista/News