Mais de metade dos municípios estão sem plano de ação climática

09-04-2025

A conclusão é da 3.ª edição do Mapa de Ação Climática Municipal. Apesar das melhorias (em 2023 eram 60%), há ainda 158 municípios que não cumprem com a obrigação da Lei de Bases do Clima.

Análise incluiu um novo mapa de intensidade carbónica. Há câmaras que "não conseguem priorizar a ação climática" ou usar os dados.


Obrigados pela Lei de Bases do Clima, de 2021, a implementar o seu próprio Plano Municipal de Ação Climática (PMAC) até fevereiro de 2024, mais de metade (51%) dos municípios portugueses falharam este compromisso, revela a 3.ª edição do Mapa de Ação Climática Municipal, divulgado pela consultora Get2C. Este estudo anual, realizado desde 2022, avalia o posicionamento dos municípios portugueses face à emergência climática.


"Mais de um ano após a data-limite, 158 municípios estão sem plano municipal de ação climática", revela a análise da consultora que atua nas áreas de alterações climáticas, energia, mercados de carbono, financiamento climático e desenvolvimento sustentável. Para serem avaliados, os municípios têm de responder a cinco perguntas. Tem uma estratégia de adaptação às alterações climáticas? (100% diz que sim) Tem uma estratégia de energia? (57%) Tem um compromisso de neutralidade carbónica? (31%) Tem uma estratégia e/ou roteiro para a neutralidade carbónica? (15%) Tem um Plano Municipal de Ação Climática? (49%).


Traduzindo as conclusões do inquérito para o mapa do país, é possível observar que 42 municípios cumprem todos os cinco requisitos, 48 cumprem apenas quatro deles, 70 cumprem três, 18 cumprem dois e a grande maioria, 130, cumpre apenas um. "A grande maioria dos municípios com três ou mais requisitos cumpridos estão concentrados nas regiões norte e centro", frisa o documento.
Ainda assim, o estudo reconhece "avanços significativos em algumas frentes", mas sublinha que apenas 150 dos 308 municípios tinham um Plano Municipal de Ação Climática em vigor ou em consulta pública em 2024. "A data-limite imposta pela Lei de Bases do Clima expirou em fevereiro de 2024 e, mais de um ano depois, o incumprimento é a norma, e não a exceção. A nova edição deste mapa revela que a resposta municipal continua muito aquém do exigido pela legislação e pela urgência climática", conclui o relatório.


Planeamento é cada vez mais um fator de competitividade


"Embora haja progressos, o facto de mais de metade dos municípios ainda não terem um PMAC em 2024 é motivo de preocupação. A transição climática está em curso, mas a passos lentos e desiguais. É urgente acelerar", sublinha Jorge Cristino, "partner" da Get2C, sublinhando que, além de cumprir metas climáticas, a ação municipal tem um impacto direto na captação de população, empresas e financiamento. "O planeamento climático é, cada vez mais, um fator de competitividade e resiliência territorial", garante.


Desde a sua primeira edição, o Mapa de Ação Climática Municipal tem permitido acompanhar a evolução do compromisso dos municípios com a neutralidade carbónica. Há três anos, apenas 11% tinham assumido esse objetivo. Com a aprovação recente de vários planos, a percentagem quase triplicou desde aí e agora são já 31,5%, ou seja, 97 municípios, dos quais 47 com estratégias ou roteiros específicos para se tornarem neutros em carbono.


Outro dado positivo, diz o estudo da Get2C, prende-se com as estratégias de energia, já que 177 municípios deram conta de que têm um plano neste setor, ou seja, mais 118 do que no ano anterior. "A energia foi sempre priorizada, e mais visível do ponto de vista da poupança e da transição, dado também o grande impulso proveniente da tecnologia e das renováveis", refere o especialista. No que diz respeito à adaptação às alterações climáticas, todos os municípios portugueses garantem estar "cobertos por uma estratégia municipal ou intermunicipal, ainda que muitas delas sejam de primeira geração, com quase 10 anos de existência".


Já os transportes têm "ficado para trás" na concretização das metas de redução de emissões. "Por um lado porque a transição do ponto de vista do consumo energético não tem sido tão favorável como devia e, por outro, pela falta de capacidade dos municípios e regiões em verem concretizados projetos de investimento no transporte público, além de ser bastante dispendioso", explica.

Há 117 municípios (38%) situados na faixa interior do país que apresentam uma intensidade carbónica residual.

A análise inclui um novo mapa de intensidade carbónica que revela "fortes discrepâncias territoriais", com os municípios do litoral - especialmente nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto - a registarem os níveis mais elevados de emissões por km², em energia e transportes. "É de destacar que 117 municípios portugueses (38%) situados na faixa interior de Portugal apresentam uma intensidade carbónica residual, enquanto em 60 da zona litoral (19%) esta é elevada ou muito elevada".


"Estes dados transmitem uma mensagem de alerta, pela inação crónica. Continuamos a não ter adesão generalizada das autarquias às políticas públicas de ação climática, provando um crescente fosso de desigualdade entre os municípios líderes e os mais atrasados, que são a maioria", diz Jorge Cristino salientando que, na comparação com anos anteriores, se observa uma evolução lenta.


Quanto aos motivos para a fraca adesão, o consultor diz que são vários. Para começar, os municípios mais pequenos não conseguem priorizar a ação climática. A razão? "Falta de meios técnicos e financeiros, de capacidade para acudir a instrumentos de planeamento, mas também de conhecimento para implementar ações relacionadas com a adaptação e a mitigação das alterações climáticas". "Acham demasiado complexo calcular as emissões municipais e monitorizá-las, quando já existem ferramentas para o fazer. E também não veem utilidade no processo."


Outro alerta, refere o especialista, resulta da "dificuldade das autarquias associarem todas as medições e monitorizações à prática real local", com medidas concretas. "Os municípios devem, através destas ferramentas, fazer a ligação aos orçamentos municipais e aos instrumentos de gestão territorial. Se não existir esta capacidade de ligar à gestão financeira, investimento e ao planeamento e ordenamento territorial, não passam de documentos para a gaveta. Existem muitas ações de diversa escala que as autarquias podem realizar para melhorar a sua performance climática e ambiental", remata.

FONTE: jornaldenegocios.pt